Confira abaixo a íntegra da entrevista do Prof Ivan Henrique de Mattos e Silva ao Observatório TV
O mês de julho de 2020 foi marcado pelo centenário de nascimento de Celso Furtado. O economista deixou um legado teórico para pensar os processos de desenvolvimento de países de capitalismo tardio, como o Brasil.
Celso Furtado nasceu na Paraíba no dia 26 de julho de 1920. Criador de uma obra inovadora, com uma leitura moderna sobre as contradições do capitalismo, Celso Furtado continua como um dos grandes nomes do pensamento político brasileiro.
Para analisar e discutir as contribuições do pensamento de Celso Furtado, o Observatório convidou o pesquisador da Universidade Federal do Amapá, Ivan Henrique de Mattos e Silva.
Em entrevista ao Observatório TV, o pesquisador comenta sobre o legado deixado pelo economista brasileiro.
“Celso Furtado é possivelmente o economista de maior prestígio na história do pensamento econômico brasileiro internacionalmente”, destaca Ivan Silva.
Indicado ao prêmio Nobel de economia de 2003, Celso Furtado é o brasileiro mais lido no mundo em âmbito econômico.
O pesquisador da Unifap, Ivan Silva, explica que o economista é um intelectual que assume para si a dupla tarefa de pensar e produzir uma síntese para o Brasil para só assim transformá-lo.
De acordo com o professor Ivan Silva, na filosofia grega, Platão pensava o Demiurgo como um arquiteto universal ou um princípio norteador, em suma, aquele que trabalha em função do público. Celso Furtado era um Demiurgo.
Um dos principais expoentes do Estruturalismo Latino-americano, o economista apresentou uma contribuição nova para a interpretação internacional do capitalismo e como ele se manifesta nas chamadas “periferias do capitalismo”.
Dessa forma, Furtado participou nacional e internacionalmente da gestão do estado e instituições estatais e paraestatais para pensar e construir não só o Brasil, como a América Latina.
“Furtado é uma figura de extrema relevância e de primeira grandeza não só na nossa trajetória, mas como de toda a América Latina”, explica o Ivan Silva.
Periferias do Capitalismo
Em um dos seus principais estudos, Celso Furtado destacou que a questão da formação econômica brasileira era um fator essencial para a superação do subdesenvolvimento. No Brasil, ainda hoje permeia-se diversas particularidades da economia amazônica que impede que ela supere seus problemas estruturais, sendo o principal fator o modelo colonial.
A teoria econômica de Celso Furtado se debruça no debate da época acerca do atraso da América Latina, que era compreendido de forma cronológica. O economista complexifica esse pensamento, alegando que o atraso latino-americano não é temporal e sim estrutural por determinantes outros, e não só econômicos.
O professor Ivan Silva explica que essa compreensão é proveniente da gêneses social brasileira, enquanto perspectiva histórica, ou seja, o que explica o Brasil pensando a partir do que é construído pelo “sentido da colonização”.
“O Brasil já nasce capitalista, a questão é que o Brasil não nasce enquanto nação e sim como empreendimento, possuindo um sentido específico que é suprir a metrópole de bens primários”, explica o professor.
O atraso brasileiro diz respeito ao modo como o país se construiu como nação derivado de seus legados como a escravidão, latifúndios e a herança colonial. “O capitalismo latino-americano seria a própria forma de manifestação do capitalismo na periferia”, explica Ivan Silva.
A inserção dos países periféricos, como o Brasil, no circuito internacional era subalterna e se encaixava em um sistema de dominação.
Países como os EUA compram a matéria prima dos países periféricos por um preço baixo e transformam em produtos, que quando voltam aos países periféricos, possuem um valor elevado e de difícil acesso.
“O valor agregado dos bens primários é sempre muito mais baixo que dos bens materiais”, explica o professor.
Ivan explica que o pensamento Furtadiano foi inovador do ponto de vista intelectual devido às especificidades na leitura, que analisa o capitalismo aplicado à periferia, a partir das particularidades da própria periferia.
Brasil e o atraso estrutural
Com base no pensamento de Furtado, o atraso brasileiro não se define apenas pela sua economia, mas também por matrizes sociais, culturais e políticas derivadas da sua chamada “gêneses social”. Ou seja, o Brasil sofre as consequências, até hoje, de sua colonização.
Celso Furtado acreditava que para a superação desse atraso estrutural seria preciso um processo de aprofundamento democrático e de distribuição de renda. “Aprofundar a democracia e aprofundar a distribuição de renda seria, portanto, superar nossos legados históricos do colonialismo e da escravidão”, explica o professor Ivan Silva.
Para a leitura furtadiana, o processo de mudança de estrutura reprodutiva nacional seria suficiente para o Brasil caminhar no sentido da superação do subdesenvolvimento enquanto estrutura.
Dessa forma a figura do Estado e dos intelectuais se torna central no debate de construção da análise e construção de projetos específicos. Celso Furtado, enquanto pensava o Brasil, participou do Plano de Metas no governo de Juscelino Kubistchek e foi o primeiro-ministro do desenvolvimento do país na gestão de João Goulart.
Com o Ato Institucional 5, o mais rigoroso da ditadura militar brasileira, Celso Furtado foi exilado. Em 1986, voltou ao país e deu continuidade ao seu trabalho sendo o ministro da cultura no governo de José Sarney.
Furtado pensou ainda na desigualdade regional dentro do país, sendo a Amazônia a periferia dentro da periferia. “Vários clássicos buscaram pensar o Brasil, no entanto como uma coisa só, não dando a devida atenção para as especificidades regionais no caso brasileiro”, explica Ivan.
O pesquisador Ivan Silva explica ainda que Celso Furtado se preocupou muito com as especificidades regionais do país. A desigualdade regional é, assim, um dos fatores determinantes do atraso estrutural brasileiro.
Confira a entrevista completa com o pesquisador da Universidade Federal do Amapá, Prof Dr
Ivan Henrique de Mattos e Silva, ao Observatório TV.