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Reportagem: Clarice Dantas
Redes de apoio surgem como alternativa para orientar e acolher mulheres vítimas de violência na quarentena
A Organização das Nações Unidas (ONU) tem recomendado uma série de medidas para o combate efetivo e a prevenção da violência contra a mulher durante a pandemia. Em uma das propostas, destaca-se maiores investimentos em serviços online, o que o Estado do Amapá adotou como forma de facilitar o caminho de mulheres que necessitam registrar uma ocorrência.
Entretanto, essa opção apresenta limitações que implicam na segurança e bem-estar de mulheres que precisam realizar a denúncia. Como E. A., que conta ter um boletim de ocorrência parado desde o mês de abril na plataforma da Delegacia Virtual da Policia Civil.
“Acabei um relacionamento com um rapaz e ele começou a ameaçar nas redes sociais, me ligava e me mandava mensagens agressivas o tempo todo”, desabafou. “Fui na delegacia presencialmente, já que pela internet não funcionou. Lá me disseram que não poderiam me atender, porque só estavam atendendo flagrante, e eu teria de esperar a normalização dos serviços”.
A Secretaria Extraordinária de Políticas para Mulheres (SEPM) informou a existência de 31 órgãos dentro da rede de atendimento a mulher, dentre eles a delegacia, uma das maiores portas de entrada. Lucianne Gomes, gerente de articulação institucional da SEPM e responsável por coordenar os centros de atendimento à mulher, diz que independentemente de haver unidades especializadas, a vítima de violência precisa encontrar o atendimento que precisa em qualquer delegacia.
“Durante a pandemia, temos recebido diversos casos pelas redes sociais e pelo WhatsApp”, observa Lucianne, “Normalmente por terceiros, que nos notificam de casos de mulheres que precisam de ajuda, que são privadas do uso do celular pelo próprio agressor ou que não conseguem chegar até a delegacia”. Quando esses casos são notificados, a secretaria vai em busca dessa mulher onde quer que ela esteja.
“Nesse momento de pandemia, uma das nossas alternativas seria despertar a família e esses amigos que estão ao redor”, constata a Secretária da SEPM, Renata Apóstolo. “Os dados provam que uma mulher, quando sofre violência, o primeiro círculo que é quebrado é com a família. O agressor afasta dos familiares, dos amigos e a vítima se vê sozinha” afirma.
Ela diz ainda que as estratégias de combate e prevenção a violência doméstica precisam começar com a responsabilização da família e da sociedade, de que a violência contra mulher não é um problema só da mulher, mas sim de todos. “Há muito esse estigma de que violência doméstica se trata de uma briga de casal, mas não é. É importante intervir e não ter medo de ajudar e denunciar”.
Redes de apoio fortalecem o combate a violência doméstica
A “Frente de Apoio Emergencial Às Mulheres Vítimas de Violência Doméstica no Amapá (FAEMVVD-AP)”, é uma alternativa independente que objetiva prestar assistência a mulheres vítimas de violência no período da quarentena. No último dia 7, a frente lançou nas redes sociais um ‘vídeo silencioso’ como campanha voluntária de conscientização da população acerca do tema.
De acordo com Alice Miranda, uma das coordenadoras, a rede é formada por assistentes sociais, psicólogos e advogados voluntários dispostos a garantir o bem-estar da mulher. “Após o contato com a rede, a vítima é encaminhada para o psicólogo disponível para ser acolhida, e quando se sentir segura e confortável, é orientada a fazer a denúncia”.
Recentemente o Amapá noticiou redução de quase 50% dos registros de ocorrências relacionadas a violência contra mulher. De acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), no mês de abril as denúncias feitas no 190 aumentaram 38% e os casos de feminicídio, 22%. Com as medidas de isolamento e as delegacias não funcionam mais 24h, o percentual de registros presenciais despencou. O acréscimo no índice de violência contra mulher indica que o Amapá não esteja indo ao oposto desses aumentos.
Alicia acredita que apesar da surpreendente redução, os números não refletem uma realidade. O problema é a dificuldade de registro das ocorrências. “São poucas as mulheres que conhecem os números de denúncia, sabem como chegar numa delegacia, que tem internet em casa ou até mesmo um celular”, explica.
As subnotificações, assim como as múltiplas dificuldades em registrar denúncias, não são consideradas nas estatísticas que apontam redução significativa dos casos no Amapá.
Atendimento obrigatório para casos de violência contra mulher
Na última quarta-feira (10), a Câmara dos Deputados aprovou um projeto de lei que garante continuidade do atendimento das mulheres vítimas de violência doméstica durante a pandemia. O texto estabelece que crimes como feminicídio, lesão corporal grave, ameaça com uso de arma de fogo, estupro, dentre outros, devem ser considerados prioridade no atendimento.
É nesse momento de fragilidade, que campanhas como as realizadas por organizações como a FAEMVVD-AP, atuam efetivamente, provocando a conscientização e solidariedade coletiva acerca da violência doméstica.
Familiares, amigos, vizinhos precisam estar alertas para os mínimos sinais de que uma mulher precisa de ajuda. É preciso que as vítimas saibam que possuem o apoio de quem está ao redor, e ouvir é o que incentiva a vítima a falar.
Se você está sofrendo algum tipo de violência ou conhece alguém que está, ligue para o 180 e denuncie, falar faz a diferença.